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Tenho minha vida de volta, diz jovem preso injustamente por 1 ano

Repro­dução: © Fer­nan­do Frazão/Agência Brasil

Carlos Vitor teve reconhecimento de foto errada por vítima de roubo


Publicado em 27/07/2024 — 17:38 Por Cristina Indio do Brasil — Repórter da Agência Brasil — Rio de Janeiro

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Com­ple­tar o cur­so téc­ni­co de enfer­magem e ser aprova­do em um con­cur­so públi­co para tra­bal­har na profis­são que pas­sou a admi­rar depois de ficar inter­na­do em um hos­pi­tal de São Gonça­lo, na região met­ro­pol­i­tana do Rio, para tratar um corte na mão. Ess­es são os planos de Car­los Vitor Fer­nan­des Guimarães, 25 anos, que foi solto na últi­ma quin­ta-feira (25), com a sen­sação de que final­mente con­quis­tou a vida de vol­ta, após ter fica­do pre­so no Presí­dio Evaris­to de Moraes, em São Cristóvão.

“É um momen­to para mim de extrema feli­ci­dade poder estar com min­ha família nova­mente e poder voltar à min­ha vida nor­mal, faz­er meu cur­so, voltar a tra­bal­har na min­ha área de trancista. Ter min­ha vida de vol­ta, voltar à min­ha real­i­dade, emb­o­ra eu ain­da este­ja achan­do que estou son­han­do, mas graças que esse pesade­lo acabou”, con­tou o jovem, pre­so injus­ta­mente, em entre­vista à Agên­cia Brasil.

Rio de Janeiro (RJ) 25/07/2024 – Carlos Vitor Guimarães com a mãe, Viviane Vieira Teixeira, a avó, Verônica Souza, e a defensora pública Lucia Helena Oliveira, após ser solto do Presídio Evaristo de Moraes. O jovem negro de 25 anos, morador de São Gonçalo, esteve preso durante um ano e meio após ser condenado por roubo de carga apenas com reconhecimento por foto, e está absolvido pelo Superior Tribunal de Justiça após pedido da Defensoria Pública do Estado. Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil
Repro­dução: Car­los Vitor Guimarães com a mãe, Viviane Vieira Teix­eira, a avó, Verôni­ca Souza. Foto: Fer­nan­do Frazão/Agência Brasil

Preso injustamente

A vida de Car­los Vitor mudou em 2018, ano em que sofreu um assalto e teve os doc­u­men­tos lev­a­dos. Na época, ele não fez um bole­tim de ocor­rên­cia. Tem­pos depois, o jovem foi chama­do a prestar depoi­men­to à polí­cia, pois seus doc­u­men­tos tin­ham sido encon­tra­dos em um cam­in­hão, usa­do por ladrões em um roubo de car­ga em São Paulo. Na del­e­ga­cia, o então estu­dante afir­mou não ter par­tic­i­pa­do do crime e insis­tiu que os doc­u­men­tos tin­ham sido rou­ba­dos ante­ri­or­mente.

Não adiantou. Mes­mo sem nun­ca ter cometi­do um crime, a foto de Car­los Vitor entrou para o álbum de sus­peitos da polí­cia. E foi isso que mudou a história do jovem.

O motorista do cam­in­hão fez um recon­hec­i­men­to fotográ­fi­co em audiên­cia judi­cial em 2021 e apon­tou Car­los Vitor como um dos autores do roubo, ape­sar de ter dito que o ladrão tin­ha cabe­lo no esti­lo black pow­er. João Vitor usa­va tranças lon­gas na época.

Ape­sar da divergên­cia no recon­hec­i­men­to, Car­los Vitor foi con­de­na­do, em out­ubro de 2021, a seis anos, cin­co meses e 23 dias de prisão, em regime ini­cial semi­aber­to.

“Pes­soal­mente, em chama­da de vídeo, ele teve difi­cul­dade de recon­hecer o Car­los pelo pas­sar dos anos, mas quan­do viu a foto da iden­ti­dade, que esta­va no álbum, ele teve certeza que era a foto. O juiz decre­tou que o Car­los não era inocente e ia ter que voltar para a prisão. Em 2021, a prisão foi nova­mente pedi­da e, em 2023, foi pre­so de novo”, lem­brou Viviane Vieira, mãe de Car­los Vitor.

O caso de Car­los foi con­ta­do no pro­gra­ma Cam­in­hos da Reportagem da TV Brasil, exibido em maio deste ano.

Resiliência

A família do jovem não se deu por ven­ci­da e ten­tou revert­er a prisão no Tri­bunal de Justiça do Rio de Janeiro, que negou o habeas cor­pus e a anu­lação da sen­tença. Em 2023, a família chegou à Defen­so­ria Públi­ca do Rio de Janeiro (DPRJ), que fez um pedi­do de revisão crim­i­nal, tam­bém rejeita­do pelo TJRJ.

Os defen­sores públi­cos recor­reram, então, ao Supe­ri­or Tri­bunal de Justiça (STJ). Na últi­ma segun­da-feira (22), o desem­bar­gador Otávio de Almei­da Tole­do anu­lou o recon­hec­i­men­to fotográ­fi­co feito pelo motorista de cam­in­hão e todas as provas con­tra o jovem, o que resul­tou na absolvição de Car­los Vitor e per­mi­tiu a saí­da dele da cadeia.

“Ante o expos­to, con­ce­do a ordem para dec­re­tar a nul­i­dade do recon­hec­i­men­to fotográ­fi­co, bem como de todas as provas dela derivadas (art. 157 e seu §1º, ambos do CPP), o que, à mín­gua de ele­men­tos inde­pen­dentes e sufi­cientes para com­pro­var a auto­ria do paciente, leva à sua necessária absolvição”, decid­iu o desem­bar­gador.

A defen­so­ra públi­ca Isabel de Oliveira Sch­pre­jer, sub­co­or­de­nado­ra de Defe­sa Crim­i­nal, disse que a inten­sa batal­ha foi necessária para reparar a injustiça.

 

Rio de Janeiro (RJ) 25/07/2024 – Soltura de Carlos Vitor Guimarães, jovem negro de 25 anos, morador de São Gonçalo, preso durante um ano e meio ao ser condenado por roubo de carga apenas com reconhecimento por foto, absolvido pelo Superior Tribunal de Justiça após pedido da Defensoria Pública do Estado. Foto: Fernando Frazão/Agência Brasil
Repro­dução: Família do jovem Car­los Vitor recor­reu ao STJ para con­seguir a soltura dele — Foto: Fer­nan­do Frazão/Agência Brasil

“Esse caso nos trans­for­mou muito, porque a injustiça era muito patente para nós. A gente ten­ta­va mostrar isso no proces­so e o Tri­bunal de Justiça não enx­er­gou da mes­ma for­ma que nós, mas feliz­mente o STJ enx­er­gou. Como a revisão foi jul­ga­da improce­dente pelo tri­bunal, a próx­i­ma instân­cia é o STJ”, expli­cou a defen­so­ra, que atu­ou no caso jun­to com a coor­de­nado­ra de Defe­sa Crim­i­nal, Lúcia Hele­na de Oliveira.

“Eles anal­is­aram pro­fun­da­mente todas as decisões [ante­ri­ores], depoi­men­tos, então, foi uma decisão muito fun­da­men­ta­da de pes­soas que se debruçaram no proces­so. A gente ficou muito feliz com a decisão ape­sar de ela ter vin­do, tem­pos depois, que a gente gostaria”, con­cluiu.

No entendi­men­to da coor­de­nado­ra Lúcia Hele­na de Oliveira, o uso inad­e­qua­do do recon­hec­i­men­to fotográ­fi­co, recon­heci­do neste proces­so pelo STJ, cul­pa­bi­liza pes­soas inocentes, sobre­tu­do as negras.

“Este caso é mais um dos tristes exem­p­los de equívo­cos em recon­hec­i­men­to de pes­soas, que lev­am inocentes, em muitos casos, ao cárcere. O recon­hec­i­men­to de pes­soas deve ser real­iza­do de for­ma cuida­dosa e com respeito às garan­tias con­sti­tu­cionais e proces­suais, sob pena de vio­lações de dire­itos e prisões injus­tas, con­forme demon­stra­do, por algu­mas vezes, através das pesquisas da Defen­so­ria Públi­ca”, diz nota da Defen­so­ria.

Absolvido

Para Car­los Vitor, a absolvição vai abrir o seu cam­in­ho. “Eu ago­ra ten­ho opções. Quan­do eu esta­va lá den­tro [da prisão], eu pen­sei que min­ha vida tin­ha acaba­do por con­ta de nome sujo, por ser difí­cil arru­mar emprego, não poder faz­er con­cur­so públi­co. Fica tudo mais difí­cil. Como eu fui absolvi­do, sin­to que pos­so faz­er o que eu quero. O que eu quis­er eu pos­so faz­er”, disse.

O jovem rela­tou as difi­cul­dades de estar pre­so por um ano e cin­co meses, como a demo­ra na autor­iza­ção para rece­ber visi­ta da família.

“Mui­ta fal­ta do con­for­to de casa, dos abraços, de estar com a família, de poder estar com min­ha irmãz­in­ha, des­de bebez­in­ha eu tomo con­ta da min­ha irmã. Sen­ti fal­ta da min­ha roti­na tam­bém aqui na rua. Tudo muda. É tudo muito difer­ente lá den­tro”, rev­el­ou o jovem, que vol­ta a morar com a mãe no bair­ro do Col­ubandê, em São Gonça­lo.

“Ago­ra é aproveitar cada momen­to que Deus está pro­por­cio­nan­do para a gente. É uma ale­gria enorme saber que tudo isso acabou e graças a Deus meu fil­ho foi absolvi­do. Graças a Deus, tem pes­soas com coração, que se sen­si­bi­lizaram e pud­er­am nos aju­dar, que par­tic­i­param do começo até o fim”, disse, alivi­a­da, a mãe Viviane Vieira.

 

Edição: Car­oli­na Pimentel

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