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Transição de governo é regulamentada em cerca de 1 a cada 5 municípios

Seminário discute ações de prefeitos que iniciarão suas gestões

Guil­herme Jerony­mo — Repórter da Agên­cia Brasil
Pub­li­ca­do em 31/10/2024 — 09:20
São Paulo
Rio de Janeiro - A Comlurb, empresa responsável pela coleta de lixo no Rio, recolhe o lixo após a festa da virada do ano (Isabela Vieira/Agência Brasil)
Repro­dução: © cia Brasil

O proces­so de tran­sição entre gestões no Poder Exec­u­ti­vo após eleições ain­da é pouco estru­tu­ra­do no país, sendo mar­ca­do pela fal­ta de um padrão claro e de uma sequên­cia de ritos e pro­to­co­los capaz de tornar a adap­tação das novas admin­is­trações mais célere e efi­ciente. Um sem­i­nário, pro­movi­do em parce­ria entre a Fun­dação Getulio Var­gas (FGV) e o Insper (Insti­tu­to de Ensi­no e Pesquisa) dis­cu­tiu a tran­sição especi­fi­ca­mente em gov­er­nos munic­i­pais e bus­cou inte­grar a per­spec­ti­va de estu­dos sobre o tema com a de gestores públi­cos.

O even­to con­tou com a apre­sen­tação do Man­u­al de Tran­sição Munic­i­pal, lança­do no últi­mo dia 10 pelo Min­istério do Plane­ja­men­to e Orça­men­to (MPO). A pub­li­cação bus­ca ori­en­tar prefeitos que ini­cia­rão suas gestões sobre os prin­ci­pais ele­men­tos para garan­tir “a con­tinuidade de serviços bási­cos, além de for­t­ale­cer o sen­so de respon­s­abil­i­dade com a admin­is­tração públi­ca e maior racional­i­dade na toma­da de decisão, tor­nan­do mais efi­ciente os resul­ta­dos da atu­ação dos agentes públi­cos”, segun­do nota do MPO. Na ocasião, o rep­re­sen­tante da pas­ta infor­mou que haverá a com­pi­lação de ver­sões exclu­si­vas sobre saúde e edu­cação, já nos planos do min­istério.

O encon­tro foi ide­al­iza­do durante o primeiro semes­tre deste ano, segun­do Luís Paulo Bres­ciani, pro­fes­sor e vice-coor­de­nador do Pro­gra­ma de Mestra­do Profis­sion­al em Gestão e Políti­cas Públi­cas da Esco­la de Admin­is­tração Públi­ca da FGV, em razão da neces­si­dade de mel­ho­rar esse momen­to da gestão das cidades. Geral­mente, são poucos os municí­pios com leg­is­lação volta­da para essas mudanças ou com pro­to­co­los claros de tran­sição. Bres­ciani con­sid­era que este seja um tema bem estru­tu­ra­do no âmbito fed­er­al, des­de a tran­sição entre as gestões de Fer­nan­do Hen­rique Car­doso e de Lula, em 2002, e ocorre em alguns esta­dos como Per­nam­bu­co, mas na maior parte dos municí­pios não há nem insti­tu­cional­iza­ção nem estru­tu­ração.

Além de ser um proces­so recente em nos­sas insti­tu­ições ele é local­iza­do, ocor­ren­do a cada qua­tro anos para as munic­i­pal­i­dades, o que difi­cul­ta inclu­sive a pro­dução de con­hec­i­men­to acadêmi­co, mas é muito impor­tante, inclu­sive em reeleições ou na con­tinuidade de um grupo políti­co, quan­do algu­mas recom­posições podem alter­ar fig­uras-chave no primeiro escalão do Exec­u­ti­vo, com impacto sobre a con­tinuidade de políti­cas públi­cas, seja para sua extinção ou para ren­o­vação. “De todo modo, algu­ma mudança há em ter­mos de com­posição do primeiro escalão, das prin­ci­pais ban­deiras, e isso influ­en­cia proces­sos impor­tantes como a con­strução do plano pluri­an­u­al, que o prefeito terá de encam­in­har logo no primeiro ano. Tam­bém é impor­tante para garan­tir a con­tinuidade de serviços bási­cos, como saúde, assistên­cia social, edu­cação, cole­ta de lixo, abastec­i­men­to, trans­porte cole­ti­vo, abastec­i­men­to de água, etc, que têm de con­tin­uar logo após a vira­da do ano”, desta­ca Bres­ciani.

Abaixo seguem alguns tre­chos da entre­vista do pro­fes­sor à Agên­cia Brasil:

Agên­cia Brasil: nos casos de tran­sição com rup­tura ou mudança de coman­do, o que deve ser o primeiro item de atenção para quem irá começar a gerir a cidade?
Luís Paulo Bres­ciani: os serviços bási­cos, prin­ci­pal­mente os lig­a­dos ao sanea­men­to bási­co. Emb­o­ra muitos municí­pios ten­ham esse serviço por meio de con­vênios é impor­tante que o gestor se apro­prie desse proces­so, pois ele é o respon­sáv­el por isso, prin­ci­pal­mente em relação à cole­ta de lixo, que é atribuição munic­i­pal.

Tam­bém out­ros serviços, como a aber­tu­ra do próx­i­mo ano leti­vo, a con­tinuidade das unidades de saúde e assistên­cia social, além da con­ser­vação de par­ques e áreas verdes. Todos ess­es são serviços não ape­nas visíveis mas tam­bém sen­síveis pela pop­u­lação. Em segun­do lugar, enten­der a com­posição das equipes, quem são os téc­ni­cos-chave e onde deve haver recom­posição na nova gestão. Em segui­da, tomar con­hec­i­men­to de con­vênios e parce­rias, como con­sór­cios inter­mu­nic­i­pais e con­vênios com esta­dos e o gov­er­no fed­er­al. Ess­es são os pon­tos críti­cos. Quan­do não é rup­tura, e acred­i­to que ai a gente já adi­anta a próx­i­ma per­gun­ta, você já sabe o que é o gov­er­no, já con­hece a máquina, seus pon­tos críti­cos e pos­i­tivos e já tem em mente o que quer mudar. É uma situ­ação em que a pos­si­bil­i­dade de haver sur­pre­sas é menor, na qual é fun­da­men­tal enten­der quais as novas políti­cas e pro­gra­mas de um gov­er­no que foi reeleito e vai con­tin­uar algu­mas políti­cas, mas que pre­cisa tam­bém ino­var. Para ess­es gov­er­nos é impor­tante enten­der a con­sistên­cia de novas políti­cas e esta­b­ele­cer seus fru­tos com celeri­dade, inclu­sive quan­do novas alianças políti­cas deter­minarem recom­posições, que pre­cisam ser bem delin­eadas. Aí há o risco de haver uma per­da de efe­tivi­dade em relação às políti­cas em anda­men­to.

Agên­cia Brasil: e qual a importân­cia de uma boa relação dos prefeitos com os órgãos de con­t­role nesse proces­so?
Bres­ciani: ela é bem impor­tante. Além da relação com os tri­bunais de con­tas, das infor­mações disponíveis tan­to nos tri­bunais de Con­tas dos esta­dos quan­to da União, assim como aque­las infor­mações que estão disponíveis nos por­tais de Transparên­cia, onde há muitas infor­mações não geren­ciáveis, que pre­cisam ser enten­di­das pelos novos gestores, existe todo um proces­so de pas­sagem dessas infor­mações, que são com­plexas e neces­si­tam da par­tic­i­pação das con­tro­lado­rias munic­i­pais e de out­ros órgãos de con­t­role dos municí­pios para que sejam efi­cientes. Essa par­tic­i­pação e a tro­ca de infor­mações sub­stan­ti­vas é fun­da­men­tal para as equipes que vão assumir.

Agên­cia Brasil: e esse proces­so podemos diz­er que já está maduro no país?
Bres­ciani: em ger­al, os proces­sos de tran­sição são bas­tante restri­tos. Cer­ca de 18% dos municí­pios têm já uma práti­ca de tran­sição mais estru­tu­ra­da, mas esse ain­da é um proces­so muito pon­tu­al e esporádi­co, como foi dito em algu­mas mesas do sem­i­nário. Não exis­tem proces­sos bem estru­tu­ra­dos de tran­sição munic­i­pal, via de regra, e ela sem­pre é depen­dente de um pacto entre os prefeitos que saem e os que entram. Ocorre que, muitas vezes, não é comum que ess­es prefeitos, tan­to os que deix­am o car­go quan­to os que assumem, não ten­ham dis­posição para um proces­so pactu­a­do de tran­sição, com tro­ca de infor­mação, infor­mação livre e uma comis­são respon­sáv­el por isso. Podemos ter, por exem­p­lo, uma tran­sição boa ago­ra, em 2024, em algu­mas cidades, mas isso não ter ocor­ri­do em 2020 ou não ocor­rer nova­mente em 2028, pois depende dess­es dois atores na maio­r­ia das cidades do país. Isso [a con­strução dess­es proces­sos] é impor­tante para cri­ar uma cul­tura de tran­sição ao lon­go dos próx­i­mos anos e alternân­cias.

Agên­cia Brasil: como isso vai de encon­tro com a dis­cussão sobre extinção da reeleição, que está sendo retoma­da?
Bres­ciani: não dis­cu­ti­mos muito essa questão ain­da, e par­tic­u­lar­mente sou con­trário, mas inde­pen­den­te­mente dis­so, da manutenção ou não dessa pos­si­bil­i­dade, você terá ain­da, em ger­al, can­didatos da con­tinuidade e con­tin­ua ten­do dois proces­sos. Um quase nat­ur­al, que mes­mo assim pre­cisa ser pactu­a­do, com regras, e out­ro com rup­tura, onde nor­mal­mente a gente tem tran­sições tumul­tuadas, onde o novo gov­er­nante chega e, por exem­p­lo, alguns sis­temas são apa­ga­dos. É uma nar­ra­ti­va que aparece com fre­quên­cia, é menos fre­quente do que aparenta ser, mas não temos uma men­su­ração. Para evi­tar isso é pre­ciso ter um proces­so estru­tu­ra­do, pro­to­co­la­do e que inclua os órgãos de con­t­role e tran­sição. Isso tam­bém é, ou dev­e­ria ser, de inter­esse dos prefeitos, pela respon­s­abil­i­dade em torno daqui­lo que der erra­do.

Agên­cia Brasil: em relação a esse inter­esse por parte dos prefeitos, podemos diz­er que temos um sis­tema já nat­u­ral­iza­do?
Bres­ciani: temos um proces­so bas­tante esta­b­ele­ci­do de con­t­role e respon­s­abi­liza­ção. Claro que pode haver fal­has nesse proces­so, mas, em ger­al, temos proces­sos bem estru­tu­ra­dos de gestão, val­i­dação e con­t­role. Pode haver, em alguns momen­tos, tam­bém alguns exces­sos, quan­do [a buro­c­ra­cia] leva a um proces­so dis­fun­cional, mas podemos diz­er que temos uma estru­tu­ração bas­tante razoáv­el dos órgãos de con­t­role. Ago­ra, do pon­to de vista dos novos prefeitos é impor­tante que con­heçam, ten­ham clareza, não ape­nas dos papéis, mas tam­bém de qual a relação dos órgãos de con­t­role com seu municí­pio, até para esclare­cer questões, pois alguns tri­bunais de con­tas têm uma práti­ca de diál­o­go e ori­en­tação, além das de con­t­role e apon­ta­men­to.

Agên­cia Brasil: essa cul­tura de con­t­role é uni­forme no país hoje?
Bres­ciani: creio que não. Claro que a gente tem históri­cos insti­tu­cionais difer­entes nos esta­dos hoje, pois a relação é com os órgãos estad­u­ais e há especi­fi­ci­dades.

Agên­cia Brasil: e quan­do ess­es proces­sos devem começar?

Bres­ciani: eles podem sur­gir não como uma deter­mi­nação, de cima para baixo, mas dos próprios inter­es­sa­dos em assumir o gov­er­no munic­i­pal, ou seja, os gov­er­nantes que tomam posse no dia 1º de janeiro, que já podi­am pen­sar em como ess­es proces­sos ini­ci­am com um desen­ho mais claro, em cada municí­pio, antes mes­mo de o pleito ser final­iza­do. É impor­tante tam­bém que se con­heça mel­hor as boas práti­cas já esta­b­ele­ci­das. Esse alcance insti­tu­cional maior é mais viáv­el, assim como sua reg­u­lação, nas grandes cidades. Tam­bém é impor­tante que esse proces­so seja con­heci­do, estru­tu­ra­do e con­duzi­do da for­ma repub­li­cana, como dev­e­ria ser.

Agên­cia Brasil: esse proces­so é mais sim­ples para os grandes municí­pios, pelas suas estru­turas mais com­plexas, do que para os pequenos, mes­mo que ten­ham tam­bém uma gestão mais sim­ples?
Bres­ciani: em tese sim, pois eles têm boas máquinas, bons quadros téc­ni­cos e boa estru­tu­ração. Isso em função de capaci­dades insti­tu­cionais que ess­es municí­pios maiores já têm e podem colo­car à dis­posição dess­es pro­je­tos. Ago­ra, em pequenos municí­pios, nada impede que sejam tam­bém vir­tu­osos nes­sa questão, e aí entra a capac­i­tação dos municí­pios, dos gestores e prin­ci­pal­mente dos servi­dores de car­reira, que irão ficar de um gov­er­no para o out­ro e são impor­tantes nesse proces­so. Nesse momen­to [do ano] em que cheg­amos, após a eleição, temos por exem­p­lo a par­tic­i­pação de par­tidos que estão fazen­do a for­mação dess­es novos gestores. Uni­ver­si­dades e asso­ci­ações munic­i­pal­is­tas tam­bém pode­ri­am par­tic­i­par dess­es proces­sos. Se a gente quer faz­er uma boa tran­sição para 2028 temos de preparar as equipes com  boa ante­cedên­cia. Hoje, municí­pios grandes e esta­dos têm condições mais favoráveis para ess­es proces­sos. Ago­ra, ele não é um bom proces­so por si mes­mo, tem por final­i­dade faz­er com que o gestor que assuma faça um bom proces­so, aten­den­do e cor­re­spon­den­do às deman­das da pop­u­lação.

Agên­cia Brasil: no sem­i­nário foram apre­sen­ta­dos alguns ele­men­tos de apoio para ess­es gestores. Quan­do eles começam a ter impacto? Podem ser pen­sa­dos já em fase de can­di­datu­ra, como na con­strução do plano de gov­er­no?

Bres­ciani: den­tro da questão da capac­i­tação, e volta­do aos man­u­ais, car­til­has e guias de capac­i­tação, tive­mos a car­til­ha do min­istério (do Plane­ja­men­to e Orça­men­to) de tran­sição para gov­er­nos munic­i­pais. Hoje, a pro­fes­so­ra Maria do Car­mo Meirelles, da Uni­cid [Uni­ver­si­dade Cidade de São Paulo], e o pro­fes­sor Fer­nan­do Coel­ho, da USP, mostraram suas pesquisas e o mate­r­i­al que pro­duzi­ram em 2020 [para apoio a pequenos e médios municí­pios paulis­tas] sobre o tema. A existên­cia de mate­ri­ais desse tipo é impor­tante pois per­mite que equipes, can­di­dat­uras e even­tu­ais equipes já se informem com grande ante­cedên­cia, inclu­sive apoian­do a con­strução de pro­gra­mas de gov­er­no a par­tir de um estu­do mais fino da situ­ação exis­tente. Pode ter, sim, papel na con­strução de pro­gra­mas mais robus­tos e qual­i­fi­ca­dos, mas esta­mos olhan­do prin­ci­pal­mente para o papel dess­es instru­men­tos nas tran­sições.

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