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Tratar “saidinha” como problema é medida eleitoreira, diz sociólogo

Mudança na legislação sobre saída temporária tem causado polêmica

Guil­herme Jerony­mo — Repórter da Agên­cia Brasil
Pub­li­ca­da em 24/09/2024 — 08:29
São Paulo
Penitenciária federal de segurança máxima de Brasília.
© Marce­lo Camargo/Agência Brasil

A recente mudança na leg­is­lação sobre o dire­ito às saí­das tem­porárias de pre­sos em regime semi­aber­to, as chamadas “said­in­has”, tem rece­bido atenção de gov­er­nos como questão fun­da­men­tal para a segu­rança públi­ca. Essa atenção vem na esteira da refor­ma da Lei de Exe­cução Penal, pro­movi­da com a dis­cussão célere do PL 14.843/2024, fei­ta de for­ma “demagóg­i­ca, eleitor­eira e que rep­re­sen­ta grande retro­ces­so”, de acor­do com Bened­i­to Mar­i­ano, sociól­o­go e ex-ouvi­dor das Polí­cias de São Paulo.

Aprova­da no primeiro semes­tre, a mudança na leg­is­lação teve con­tes­tação no Judi­ciário e aguar­da jul­ga­men­to no Supre­mo Tri­bunal Fed­er­al (STF), em relação à proibição do bene­fí­cio para fim que não seja o de estu­dar.

Além da proibição das saí­das tem­porárias o pro­je­to alter­ou a for­ma como ocorre a pro­gressão de penas, o que é o pon­to mais prob­lemáti­co, segun­do Mar­i­ano. “Tra­ta-se de um absur­do, pois não temos esse exame, na práti­ca, nos últi­mos 20 anos, e há um poten­cial para cri­ar o caos no sis­tema. É uma medi­da que não aju­da em nada a segu­rança públi­ca, o sis­tema pri­sion­al e tende a cri­ar difi­cul­dades para o gov­er­no fed­er­al, pois pode ger­ar ten­são no sis­tema, que já é super­lota­do e pre­cisa de out­ras medi­das”, comen­ta o sociól­o­go.

Em entre­vista à Agên­cia Brasil, Mar­i­ano esclare­ceu que se desen­ha uma situ­ação com­plexa, que deve exi­gir muito das autori­dades já em dezem­bro, pois o sis­tema é super­lota­do e sofre de defasagem de profis­sion­ais qual­i­fi­ca­dos para realizar os exam­es crim­i­nológi­cos, ago­ra necessários à pro­gressão. O espe­cial­ista criti­cou inclu­sive a posição dos par­tidos da situ­ação, que não ten­taram bar­rar essa questão nem nas votações nem na proposição de vetos por parte do Exec­u­ti­vo.

Para Bened­i­to Mar­i­ano, o cidadão não gan­ha nada com esse tipo de leg­is­lação e com a divul­gação de prisões durante as said­in­has, que não infor­mam sobre a função social da lei. As regras pre­vis­tas, que tin­ham qua­tro décadas, já esta­b­ele­ci­am muitos critérios. “Pas­sou-se a ideia de que a said­in­ha é para todos os pre­sos, o que não é ver­dade. Ela não inter­feriu e não inter­fere em nada na segu­rança públi­ca. Temos no Brasil mais de 46 mil mortes vio­len­tas por ano e essa lei não influ­en­cia em nada, ape­nas joga uma questão téc­ni­ca para o sen­so comum”, com­ple­tou. Ao rebaixar o diál­o­go, perde-se um pon­to essen­cial na Lei de Exe­cução Penal, expli­cou o sociól­o­go, a de que a pes­soa pos­sa cumprir sua pena e voltar para a sociedade reabil­i­ta­da. O temor do estu­dioso é de que isso pos­sa ser o estopim para insta­bil­i­dade nas prisões já em dezem­bro.

O bene­fí­cio é pre­vis­to na Lei de Exe­cução Penal e tem qua­tro datas pre­vis­tas durante o ano no esta­do, nos meses de março, jun­ho, setem­bro e dezem­bro. O tema foi inten­sa­mente debati­do no começo do ano, com pressão de par­tidos de oposição, prin­ci­pal­mente o Par­tido Lib­er­al (PL) con­trários ao dire­ito.

Aprova­do nas duas câmaras, a decisão, parte da Lei 14.843/2024, foi veta­da pelo pres­i­dente Lula. O Sena­do der­rubou o veto em 28 de maio, acom­pan­han­do a votação da Câmara dos Dep­uta­dos. Hoje, o bene­fí­cio é garan­ti­do aos que tin­ham o dire­ito antes da mudança da lei, ques­tion­a­da em três ações dire­tas de Incon­sti­tu­cional­i­dade no Supre­mo Tri­bunal Fed­er­al, onde aguar­da jul­ga­men­to.

Des­de a últi­ma sex­ta-feira (20), a impren­sa paulista tem rece­bido infor­mações con­tínuas e em tom pos­i­ti­vo de deten­tos ben­efi­ciários das “said­in­has” tem­porárias que foram pre­sos no esta­do, em situ­ações con­trárias às pre­vis­tas na con­cessão do bene­fí­cio, envolto em polêmi­ca des­de maio, quan­do foi proibido após der­ruba­da de veto pres­i­den­cial. Os dados da Sec­re­taria estad­ual de Segu­rança Públi­ca (SSP/SP) são de 769 pre­sos des­de terça-feira (17), primeiro dia de saí­da dos ben­efi­ciários. Aparente­mente ele­va­do, o número é pequeno se com­para­do ao total de reed­u­can­dos do regime semi­aber­to autor­iza­dos pelo Poder Judi­ciário às saí­das, de 31.373 pes­soas. As prisões na primeira data autor­iza­da em 2024, no final de março, foram ques­tion­adas pela Defen­so­ria Públi­ca do esta­do, que apon­tou viés racial e sem fla­grante ou ordem judi­cial para a detenção.

Segun­do a sec­re­taria as prisões ocor­rem após avali­ação cuida­dosa, pois “um acor­do de coop­er­ação entre a Sec­re­taria de Segu­rança Públi­ca e o Tri­bunal de Justiça de São Paulo per­mite que os poli­ci­ais ten­ham aces­so às infor­mações dos pre­sos ben­e­fi­ci­a­dos. Dessa for­ma, é pos­sív­el ver­i­ficar, durante a abor­dagem, se as regras para a saí­da tem­porária deter­mi­nadas pela Justiça estão sendo cumpri­das, sem a neces­si­dade de levar o deten­to até uma del­e­ga­cia para a elab­o­ração do bole­tim de ocor­rên­cia. O Poder Judi­ciário esta­b­elece que o deten­to ben­e­fi­ci­a­do pela medi­da deve per­manecer na cidade declar­a­da à Justiça. Ele tam­bém fica proibido de se ausen­tar da residên­cia no perío­do noturno, fre­quen­tar bares, boates, locais de uso de entor­pe­centes, envolver-se em brigas, andar arma­do ou praticar qual­quer out­ro ato con­sid­er­a­do grave per­ante o Poder Judi­ciário”.

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