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Túmulo de Eunice Paiva vira ponto turístico após Ainda Estou Aqui

Visita ao Cemitério do Araçá resgata importância da memória e do luto

Elaine Patrí­cia Cruz — Repórter da Agên­cia Brasil
Pub­li­ca­do em 08/02/2025 — 09:37
São Paulo
São Paulo (SP), 06/02/2025 - .Capela com os restos mortais de Eunice Paiva, no cemitério do Araçá, no Pacaembu, conta com passeio guiado e recebe inúmeros visitantes após o sucesso do filme Ainda estou aqui, indicado para o Oscar em três categorias. Foto: Paulo Pinto/Agência Brasil
Repro­dução: © Paulo Pinto/Agência Brasil

Uma lápi­de colo­ca­da em uma capelin­ha azul no Cemitério do Araçá, na cap­i­tal paulista, lem­bra dela com car­in­ho: “Exem­p­lo para a família e para a democ­ra­cia brasileira”. É ali, ao lado de diver­sas capelin­has de famílias ital­ianas, que está enter­ra­da a advo­ga­da e um dos sím­bo­los da luta con­tra a ditadu­ra brasileira e pelos dire­itos humanos Maria Lucré­cia Eunice Fac­ci­ol­la Pai­va, mais con­heci­da como Eunice Pai­va (1929–2018).

A história dela ficou ain­da mais céle­bre após a atriz Fer­nan­da Tor­res tê-la inter­pre­ta­do no filme Ain­da Estou Aqui, dirigi­do por Wal­ter Salles. Indi­ca­do aos prêmios de mel­hor filme, mel­hor filme estrangeiro e mel­hor atriz no Oscar deste ano, o lon­ga é uma adap­tação do livro de mes­mo nome escrito por Marce­lo Rubens Pai­va. Neste livro, o autor nar­ra a história real de sua família, cen­tra­da na luta da mãe logo após o desa­parec­i­men­to do pai, o dep­uta­do Rubens Pai­va, lev­a­do por poli­ci­ais em 1971, durante a ditadu­ra mil­i­tar brasileira. O cor­po de Rubens Pai­va jamais foi encon­tra­do.

O suces­so da pro­dução ger­ou ain­da mais curiosi­dade sobre a vida da advo­ga­da e sobre onde ela foi enter­ra­da, prin­ci­pal­mente após a atriz Fer­nan­da Tor­res, vence­do­ra do Globo de Ouro pela inter­pre­tação de Eunice no cin­e­ma, ter feito uma visi­ta ao cemitério. “Há um ano, se encer­ravam as fil­ma­gens de Ain­da Estou Aqui e fui soz­in­ha agrade­cer a essa grande brasileira, pela hon­ra de tê-la encar­na­do no cin­e­ma. Obri­ga­da, Eunice”, escreveu a atriz em novem­bro do ano pas­sa­do, postan­do uma foto ao lado da lápi­de em seu per­fil no Insta­gram.

Visitas

Des­de então, as vis­i­tas guiadas ao Cemitério do Araçá — que pas­saram a incluir uma visi­ta ao túmu­lo de Eunice Pai­va – tem pas­sa­do a reunir cen­te­nas de vis­i­tantes. O pas­seio é orga­ni­za­do pelo pro­je­to de necro­tur­is­mo O Que Te Assom­bra?,  que já pro­movia rotineira­mente vis­i­tas gra­tu­itas a cemitérios e túmu­los de per­son­al­i­dades históri­c­as no esta­do de São Paulo. A próx­i­ma visi­ta guia­da, por exem­p­lo, está plane­ja­da para a man­hã do dia 16 de fevereiro.

“O Que Te Assom­bra? é um pro­je­to que eu ide­al­izei e que nasceu para con­tar a história de assom­bração. Ele é muito inspi­ra­do no livro Assom­brações do Recife Vel­ho, de Gilber­to Freire, que faz um para­le­lo inter­es­sante entre o desen­volvi­men­to sócio-urbano da cidade do Recife e as histórias da assom­bração”, con­tou o pesquisador e advo­ga­do Thi­a­go de Souza.

São Paulo (SP), 06/02/2025 - .Capela com os restos mortais de Eunice Paiva, no cemitério do Araçá, no Pacaembu, conta com passeio guiado e recebe inúmeros visitantes após o sucesso do filme Ainda estou aqui, indicado para o Oscar em três categorias. Pesquisador Thiago de Souza.Foto: Paulo Pinto/Agência Brasil
Repro­dução: São Paulo (SP), 06/02/2025 — .Pesquisador Thi­a­go de Souza fica feliz com o inter­es­sa da pop­u­lação pelo túmu­lo de Eunice Pai­va — Paulo Pinto/Agência Brasil

Em entre­vista à Agên­cia Brasil, ele expli­cou que essas histórias acabaram levando‑o, inevi­tavel­mente, aos cemitérios. E daí surgiu a ideia de desen­volver um novo pro­je­to, Saudade e Suas Vozes, que tem o foco no Cemitério do Araçá. Esse pro­je­to tra­bal­ha o cemitério como um lugar de memória, cul­tura, patrimônio e histórias.

“Eu nun­ca imag­inei que um cemitério tivesse tan­tas poten­cial­i­dades e fos­se um instru­men­to tão impor­tante para con­tar histórias. Eu gos­to de diz­er que o cemitério é o lugar que mel­hor con­ta as nos­sas histórias. Todo mun­do que con­stru­iu a nos­sa história des­cansa em algum cemitério. Eles são grandes con­ta­dores de história das nos­sas comu­nidades e das nos­sas cidades”, acres­cen­tou o pesquisador.

A inclusão do túmu­lo de Eunice Pai­va nas vis­i­tas guiadas que já eram real­izadas naque­la necró­pole acon­te­ceu no final do ano pas­sa­do, logo após a postagem de Fer­nan­da Tor­res, quan­do o pesquisador final­mente desco­briu que ela esta­va enter­ra­da no Araçá. E a decisão por incluí-la nes­sa visi­ta foi moti­va­da porque sua história rep­re­sen­ta não somente a luta pela democ­ra­cia, mas tam­bém reflete sobre a importân­cia das memórias e do luto.

“A história dela dialo­ga com dois aspec­tos inter­es­santes: o primeiro é a memória, a importân­cia da gente se lem­brar e da gente bus­car a ver­dade, da mes­ma for­ma que foi para ela a bus­ca por respostas sobre o paradeiro do dep­uta­do Rubens Pai­va. Mas um segun­do aspec­to que é muito impor­tante para a gente é enten­der a importân­cia dos proces­sos de luto, que é algo que talvez não fique muito per­cep­tív­el na história. A grande bus­ca da Eunice era para ter o dire­ito de saber o que tin­ha acon­te­ci­do com o seu mari­do, quem eram os respon­sáveis pela sua morte e onde ele esta­va sepul­ta­do”, reflete.

Para o pesquisador, é muito bom ver o inter­esse das pes­soas por Eunice porque, a par­tir dis­so, são feitas reflexões sobre a importân­cia da memória e sobre se reen­con­trar um sen­ti­do de com­padec­i­men­to por pes­soas que sofr­eram grandes vio­lên­cias.

São Paulo (SP), 06/02/2025 - .Capela com os restos mortais de Eunice Paiva, no cemitério do Araçá, no Pacaembu, conta com passeio guiado e recebe inúmeros visitantes após o sucesso do filme Ainda estou aqui, indicado para o Oscar em três categorias. Foto: Paulo Pinto/Agência Brasil
Repro­dução: São Paulo (SP), 06/02/2025 — .Capela com os restos mor­tais de Eunice Pai­va, no cemitério do Araçá, no Pacaem­bu — Paulo Pinto/Agência Brasil

Cemitério do Araçá

Inau­gu­ra­do em 1897, o Cemitério do Araçá foi cri­a­do dev­i­do à super­lotação do Cemitério da Con­so­lação e pelo cresci­men­to da imi­gração ital­iana em São Paulo. O nome Araçá deri­va da anti­ga Estra­da do Araçá, que era cer­ca­da por uma plan­ta de mes­mo nome. Atual­mente, essa estra­da se tornou a Aveni­da Doutor Arnal­do.

Além de abri­gar o túmu­lo de Eunice Pai­va, o Cemitério do Araçá guar­da out­ras per­son­al­i­dades impor­tantes da história do Brasil, como as atrizes Cacil­da Beck­er e Nair Bel­lo e o empresário Assis Chateaubriand. É tam­bém onde fica o mau­soléu da Polí­cia Mil­i­tar e um ossário onde antiga­mente foram orga­ni­za­dos os restos mor­tais de pes­soas assas­si­nadas pela ditadu­ra mil­i­tar e que havi­am sido enter­radas na vala clan­des­ti­na de Perus. O local tam­bém se desta­ca por obras de arte, assi­nadas por artis­tas como Vic­tor Brecheret.

Para par­tic­i­par da visi­ta guia­da ao Cemitério do Araçá não é pre­ciso pagar nada. Os orga­ni­zadores só pedem a con­tribuição de um qui­lo de ali­men­to que depois é encam­in­hado para um pro­je­to de dis­tribuição de mar­mi­tas para moradores em situ­ação de rua. As inscrições podem ser feitas por meio do per­fil O que te assom­bra? (@oqueteassombra) no Insta­gram.

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