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Unicef lança estratégia para prevenir racismo na primeira infância

Repro­dução: © Juca Varella/ Agên­cia Brasil

Programa envolve o Rio de Janeiro e mais sete capitais


Pub­li­ca­do em 23/05/2023 — 09:02 Por Alana Gan­dra — Repórter da Agên­cia Brasil — Rio de Janeiro

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Em parce­ria com o Insti­tu­to Pro­mun­do, o Fun­do das Nações Unidas para a Infân­cia (Unicef), lança nes­ta terça-feira (23) a estraté­gia Primeira Infân­cia Antir­racista (PIA). A solenidade será às 9h, na Are­na Car­i­o­ca Joveli­na Péro­la Negra, na Pavu­na, zona norte do Rio de Janeiro.

Cer­ca de 250 profis­sion­ais das áreas de edu­cação, saúde e assistên­cia social, além de lid­er­anças soci­ais e ado­les­centes, par­tic­i­parão do ato. Após palestra e roda de con­ver­sa com espe­cial­is­tas, autori­dades e jovens, será real­iza­da ofic­i­na com profis­sion­ais para tro­ca de exper­iên­cia e pro­pos­ta de novas práti­cas.

A PIA é uma estraté­gia de sen­si­bi­liza­ção sobre os impactos do racis­mo no desen­volvi­men­to infan­til na primeira infân­cia e, tam­bém, uma estraté­gia de mobi­liza­ção social volta­da para profis­sion­ais de saúde, famílias, pais e cuidadores sobre como ter práti­cas antir­racis­tas no cotid­i­ano de serviços de edu­cação infan­til, assistên­cia social e saúde. “Tam­bém a gente fala como as famílias e cuidadores podem pro­mover uma parental­i­dade antir­racista, uma edu­cação antir­racista, inde­pen­den­te­mente se seus fil­hos são cri­anças negras, indí­ge­nas ou bran­cas”, disse a espe­cial­ista em Desen­volvi­men­to Infan­til do Unicef, Maíra Souza, em entre­vista aos veícu­los da Empre­sa Brasil de Comu­ni­cação (EBC).

“A PIA nasce com essa provo­cação, ou seja, com a ideia de não só sen­si­bi­lizar sobre os impactos do racis­mo, mas tam­bém ter algo propos­i­ti­vo, ofer­e­cer cam­in­hos, soluções e fer­ra­men­tas que as pes­soas pos­sam incor­po­rar e serem, de fato, antir­racis­tas”, afir­mou Maíra.

Desenvolvimento

O fato de a PIA ser dire­ciona­da à primeira infân­cia é expli­ca­do porque esse é o perío­do da vida — de zero a seis anos de idade — em que o cére­bro da cri­ança se desen­volve com maior facil­i­dade e as bases do desen­volvi­men­to se estru­tu­ram.

“A gente já tem inúmeras evidên­cias que mostram que é na primeira infân­cia que as cri­anças viven­ci­am o racis­mo pela primeira vez. Entre os oito meses e os dois anos de idade a cri­ança começa a perce­ber as difer­enças físi­cas, de traços, de cor de pele, de altura e taman­ho. É tam­bém nes­sa eta­pa da vida que elas começam a inter­nalizar que há hier­ar­quias nes­sas difer­enças”, expli­cou.

Segun­do Maíra, é muito noci­vo e prej­u­di­cial para o desen­volvi­men­to infan­til quan­do uma cri­ança peque­na, ain­da ness­es primeiros anos de vida, percebe que os seus traços são con­sid­er­a­dos infe­ri­ores, que sua pele é con­sid­er­a­da infe­ri­or. Ela começa a perce­ber que exis­tem essas difer­enças de trata­men­to e isso acon­tece tan­to no âmbito das brin­cadeiras, como tam­bém no atendi­men­to profis­sion­al que essas cri­anças recebem. Por isso, o Unicef traz esse olhar para a primeira infân­cia, para mostrar que o racis­mo é uma for­ma de vio­lên­cia que acon­tece durante toda a vida, mas não é muito fal­a­do na primeira infân­cia. “É como se não exis­tisse”, salien­tou Maíra.

Com o lança­men­to da estraté­gia PIA, o Unicef procu­ra dar vis­i­bil­i­dade para o racis­mo e pen­sar em for­mas de pre­venir e reduzir os efeitos tão prej­u­di­ci­ais que o racis­mo impacta nas cri­anças.

Será lança­da uma série de mate­ri­ais engloban­do qua­tro cader­nos, além de uma web­série com sete vídeos sobre parental­i­dade antir­racista com influ­en­ci­adores e espe­cial­is­tas. Todos ess­es mate­ri­ais estarão disponíveis gra­tuita­mente para todo o Brasil no site do Unicef.

Conceitos

Os cader­nos se divi­dem, em um primeiro momen­to, sobre con­ceitos foca­dos no racis­mo estru­tur­al, insti­tu­cional e sistêmi­co, bran­qui­tude, incon­sciente e iden­ti­dade. Em um segun­do momen­to, os téc­ni­cos do Unicef ori­en­tam sobre os cam­in­hos e pos­si­bil­i­dades.

“A ideia é sem­pre começar a dis­cussão, mas não tem uma for­ma muito pre­s­criti­va”. No cader­no de assistên­cia social, por exem­p­lo, um dos cam­in­hos pro­pos­tos para os gestores é a incor­po­ração da temáti­ca de relações étni­co-raci­ais em pro­gra­mas de vis­i­tas domi­cil­iares, o que ain­da não existe no Brasil. Em ter­mos de edu­cação infan­til, são ofer­e­ci­dos cam­in­hos para o pro­fes­sor faz­er um exer­cí­cio sobre quais são as cri­anças que sen­tem mais afinidade, as que chamam mais atenção ou que ofer­e­cem mais afe­to.

“É um tipo de provo­cação, mas tam­bém traz algu­mas sug­estões menos sub­je­ti­vas e mais obje­ti­vas como, por exem­p­lo, disponi­bi­lizar em sala de aula mate­ri­ais que ten­ham refer­ên­cias afro-brasileiras ou indí­ge­nas, visan­do estim­u­lar o ambi­ente com rep­re­sen­ta­tivi­dade em sala de aula”, acen­tu­ou.

Em relação à saúde, a atenção é volta­da ao aces­so a dire­itos, como o pré-natal ade­qua­do, que é menor entre mães indí­ge­nas e negras do que entre mães bran­cas, con­forme indicam alguns estu­dos.

A atenção é des­per­ta­da tam­bém para práti­cas mais recor­rentes, como mães negras e indí­ge­nas rece­berem menos aneste­sia e não terem aces­so ao par­to human­iza­do. Há destaque ain­da para comor­bidades que são mais comuns em cri­anças negras, caso da ane­mia fal­ci­forme.

“A ideia é apro­fun­dar um pouco mais nes­sas áreas seto­ri­ais e tam­bém na parte dos vídeos e da web serie, e traz­er esse olhar da parental­i­dade. Como falar sobre racis­mo e sobre relações étni­co-raci­ais com seus fil­hos; como ensi­nar que as difer­enças não devem ser hier­ar­quizadas; como val­orizar os traços das cri­anças; e como con­ver­sar e falar mes­mo que não existe brin­cadeira com racis­mo”, frisou Maíra.

Territórios

A par­tir do lança­men­to no Rio de Janeiro, o pro­je­to será focal­iza­do tam­bém em mais sete cap­i­tais em que a Unicef já tem uma estraté­gia de atu­ação volta­da para a pre­venção da vio­lên­cia, que é a #Agen­daCi­dade­U­NICEF.

A pro­gra­mação pre­vê o lança­men­to em São Paulo (dia 24), Man­aus (25), Sal­vador (31), Recife (2/6), Belém (5) e For­t­aleza (26), além de São Luis, que já teve uma ofic­i­na pilo­to no dia 12 de maio. Atores locais serão con­vi­da­dos a par­tic­i­par das dinâmi­cas. Nas cap­i­tais, o alvo da PIA são oito ter­ritórios vul­neráveis onde moram, ao todo, 8,2 mil­hões de cri­anças e ado­les­centes, de acor­do com dados de 2022 do Insti­tu­to Brasileiro de Geografia e Estatís­ti­ca (IBGE).

Os ter­ritórios onde as agen­das serão apro­fun­dadas são, nas cap­i­tais men­cionadas, Pavu­na, Cidade Tiradentes, Colô­nia Anto­nio Aleixo, Valéria, Ibu­ra, Dis­tri­to d’Água, Jan­gu­rus­su e Cidade Operária. Em cada cap­i­tal, o Unicef pre­tende expor um con­tex­to local. Em Man­aus, por exem­p­lo, será dada mais vis­i­bil­i­dade para a pau­ta de influên­cias indí­ge­nas.

“Nos­so obje­ti­vo é levar ess­es mate­ri­ais para as mãos dos profis­sion­ais, dos gestores públi­cos, dos tomadores de decisão e, um dia, faz­er ofic­i­nais para dis­cu­tir não só essa temáti­ca, mas sobre o que o mate­r­i­al propõe, con­vi­dar os profis­sion­ais a definirem práti­cas antir­racis­tas nos seus serviços, no seu cotid­i­ano profis­sion­al, para con­seguir ir além, que sejam mate­ri­ais tra­bal­ha­dos de fato. Por isso, esta­mos indo para essas oito cidades”, detal­hou Maíra. |

A intenção é faz­er com que os mate­ri­ais da PIA ten­ham essa pen­e­tração e aderên­cia na rede públi­ca das oito cap­i­tais e de todo o país. Aprovei­tan­do a estraté­gia social #Agen­daCi­dade­U­NICEF, a ideia é ter uma atu­ação próx­i­ma das prefeituras e, após as ofic­i­nas, mon­i­torar quais foram os acor­dos que sur­gi­ram — prin­ci­pal­mente na parte de práti­cas antir­racis­tas — para romper o racis­mo estru­tur­al na primeira infân­cia.

A espe­cial­ista em Desen­volvi­men­to Infan­til do Unicef afir­mou que, após o lança­men­to nas oito cap­i­tais, será feito um plane­ja­men­to para avali­ação dos resul­ta­dos alcança­dos. For­mulários vão col­her as difer­entes per­cepções dos par­tic­i­pantes e em que medi­da a PIA, seus mate­ri­ais e ess­es momen­tos for­ma­tivos, con­seguem mudar a per­cepção do par­tic­i­pante sobre as difer­entes temáti­cas. “Acho que a gente vai ter um mate­r­i­al bem rico”, disse ela.

Desigualdades

Vários indi­cadores con­fir­mam a desigual­dade racial na garan­tia de dire­itos nos primeiros anos de vida. De acor­do com dados divul­ga­dos pelo Unicef, a pro­porção de bebês pre­tos e par­dos que nascem de mães que não tiver­am pelo menos sete con­sul­tas de pré-natal atinge 30%, con­tra 18% para bebês bran­cos.

Entre as cri­anças indí­ge­nas, a taxa de mor­tal­i­dade infan­til (até um ano de idade) é o dobro da taxa de mor­tal­i­dade infan­til média brasileira: 23,4 por 100 mil con­tra 11,9 por 100 mil, segun­do o Sis­tema de Infor­mação sobre Mor­tal­i­dade (SIM), do Min­istério da Saúde, ref­er­ente a 2021.As desigual­dades se repetem no aces­so à edu­cação, obser­va o Unicef. Em 2019, mais de 330 mil cri­anças entre qua­tro e cin­co anos estavam fora da esco­la, rev­ela o estu­do Desigual­dades na Garan­tia do Dire­ito à Pré-esco­la, lança­do pela Fun­dação Maria Cecília Souto Vidi­gal, com apoio do Unicef e União Nacional dos Diri­gentes Munic­i­pais de Edu­cação (Undime), em 2022. O Unicef reforça que a prob­a­bil­i­dade de cri­anças pre­tas, par­das e indí­ge­nas estarem nesse grupo era 25% maior do que cri­anças bran­cas.Na assistên­cia social o desafio é grande. Quase 70% das cri­anças de zero a qua­tro anos que estão cadastradas no CadÚni­co são negras, de acor­do com dados da Sec­re­taria de Avali­ação e Gestão da Infor­mação, do Min­istério do Desen­volvi­men­to Social (MDS) e Insti­tu­to Brasileiro de Geografia e Estatís­ti­ca (IBGE). A esti­ma­ti­va é ref­er­ente a março de 2023.

Ativação

O dese­jo do Unicef é que o pro­je­to per­maneça, se enraíze e se des­do­bre. Além dos encon­tros pres­en­ci­ais, a equipe do fun­do pre­tende pro­mover uma ati­vação da PIA em redes soci­ais, para que a dis­cussão este­ja mais pre­sente jun­to aos profis­sion­ais e aos adul­tos das famílias, fazen­do parte da estraté­gia mais lon­ga que é #Agen­daCi­dade­U­NICEF, lança­da no ano pas­sa­do e que tem pre­visão de se esten­der por três anos. A intenção é mostrar que é pos­sív­el con­stru­ir uma práti­ca antir­racista e que isso per­maneça na dis­cussão das equipes por meio dessa agen­da.

Edição: Kle­ber Sam­paio

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