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Veja íntegra da sentença que condena assassinos de Marielle e Anderson

“Justiça é lenta, é cega, é burra, mas ela chega”, afirmou juíza

Agên­cia Brasil
Pub­li­ca­do em 31/10/2024 — 19:25
Brasília
Rio de Janeiro (RJ), 31/10/2024 - Tribunal do Júri do Rio condena Ronnie e Élcio por assassinar Marielle e Anderson. Foto: Tânia Rêgo/Agência Brasil
Repro­dução: © Tânia Rêgo/Agência Brasil

Ao ler a sen­tença da con­de­nação de Ron­nie Lessa e Élcio de Queiroz, a juíza Lúcia Glioche, do 4º Tri­bunal do Júri do Rio de Janeiro, recon­heceu que o sis­tema judi­ciário brasileiro é lento, mas que quem comete crimes no país em algum momen­to vai ser punido. 

“A Justiça por vezes é lenta, é cega, é bur­ra, é injus­ta, é erra­da, é tor­ta, mas ela chega. A Justiça chega mes­mo para aque­les que, como os acu­sa­dos, acham que jamais vão ser atingi­dos pela Justiça. Com toda difi­cul­dade de ser inter­pre­ta­da e vivi­da pelas víti­mas, a Justiça chega aos cul­pa­dos e tira deles o bem mais impor­tante depois da vida, que é a liber­dade.”

Ela desta­cou as difi­cul­dades de se inves­ti­gar um crime e falou ain­da sobre os anos de sofri­men­to pelo qual as famílias de Marielle Fran­co e de Ander­son Gomes pas­saram em bus­ca de respostas para o crime.

No iní­cio da noite de hoje, os assas­si­nos con­fes­sos da vereado­ra Marielle Fran­co e do motorista Ander­son Gomes, os ex-poli­ci­ais mil­itares Ron­nie Lessa e Élcio de Queiroz foram con­de­na­dos. Ron­nie Lessa foi con­de­na­do a 78 anos, 9 meses e 30 dias. Élcio, a 59 anos, 8 meses e 10 dias.

Veja a íntegra da sentença:

“O júri é uma democ­ra­cia. Democ­ra­cia esta que Marielle Fran­co defendia.

Aqui prevalece a von­tade do povo em maio­r­ia. Aque­les que atu­am como os jura­dos nada recebem; prestam um serviço vol­un­tário, gra­tu­ito, rep­re­sen­tan­do a von­tade do povo no ato de jul­gar o semel­hante, que é acu­sa­do de ter prat­i­ca­do um crime tão grave que é quer­er tirar a vida da out­ra pes­soa.

Por­tan­to, sen­hores jura­dos, obri­ga­da em nome do Poder Judi­ciário. Obri­ga­da em nome da pop­u­lação da cidade do Rio de Janeiro.

A sen­tença que será lida, ago­ra, talvez não tra­ga aqui­lo que se espera da Justiça. Talvez justiça que tan­to se falou aqui fos­se que o dia de hoje jamais tivesse ocor­ri­do. Talvez justiça fos­se Marielle e Ander­son pre­sentes. Como se justiça tivesse o condão de traz­er o mor­to de vol­ta.

Então dize­mos que víti­mas do crime de homicí­dio são aque­les que ficam vivos, pre­cisan­do sobre­viv­er no esgo­to que é o vazio de per­manecer vivo sem a vida daque­le que foi arran­ca­do do seu cotid­i­ano.

A sen­tença não serve para tran­quil­izar as víti­mas, que são Marinete, mãe de Marielle; Anielle, irmã de Marielle; Môni­ca, esposa de Marielle; Luyara, fil­ha de Marielle; Ágatha, esposa de Ander­son, e Arthur, fil­ho de Ander­son.

Homicí­dio é um crime trauma­ti­zante — fin­ca no peito uma dor que san­gra todo dia, uns dias mais, uns dias menos, mas todos os dias.

A pes­soa que é assas­si­na­da deixa uma fal­ta, uma carên­cia, um vácuo. Que palavra nen­hu­ma descreve. Toda a min­ha sol­i­dariedade e do Poder Judi­ciário às víti­mas.

A sen­tença que será dada ago­ra talvez tam­bém não respon­da à per­gun­ta que ecoou pelas ruas da cidade do Rio de Janeiro, do Brasil e do mun­do: Quem matou Marielle e Ander­son?

Talvez ela não respon­da aos ques­tion­a­men­tos dos 46.502 eleitores car­i­o­cas que fiz­er­am de Marielle Fran­co a 5ª vereado­ra mais vota­da na cidade do Rio de Janeiro nas eleições munic­i­pais de 2016 — e que tiver­am seu dire­ito de rep­re­sen­tação ceifa­do no dia 14 de março de 2018.

Todavia, a sen­tença que será lida ago­ra se dirige aos acu­sa­dos aqui pre­sentes. E mais: ela se dirige aos vários Ron­nies e vários Élcios que exis­tem na cidade do Rio de Janeiro — livres por aí.

Eu digo sem­pre que ness­es 31 anos que eu sir­vo ao sis­tema de Justiça, nen­hum de nós do povo nun­ca saberá o que se pas­sou no dia de um crime. Quem não esta­va na cena do crime, não par­ticipou dele, nun­ca sabe o que acon­te­ceu.

Mes­mo assim, o Poder Judi­ciário e hoje os jura­dos pre­cisam jul­gar o crime com as provas que o proces­so apre­sen­ta, e traz­er às provas para o proces­so, para os jura­dos é árduo.

Porém, com todas as difi­cul­dades e todas as maze­las de inves­ti­gar um crime, o Min­istério Públi­co do Esta­do do Rio de Janeiro denun­ciou os acu­sa­dos. Eles foram proces­sa­dos e tiver­am garan­ti­do o seu dire­ito de defe­sa — e foram jul­ga­dos.

Por anos exercendo a plen­i­tude do dire­ito con­sti­tu­cional de autode­fe­sa, os acu­sa­dos juraram inocên­cia, pon­do a todo o tem­po em dúvi­da a pro­va trazi­da con­tra eles. Até que um dia, no ano pas­sa­do, 2023, por motivos que de ver­dade a gente jamais vai saber, o acu­sa­do Élcio fez a colab­o­ração pre­mi­a­da. Depois o acu­sa­do Ron­nie a fez tam­bém.

Os acu­sa­dos con­fes­saram a exe­cução e a par­tic­i­pação no assas­si­na­to da vereado­ra Marielle Fran­co.

Por isso, fica aqui para os acu­sa­dos pre­sentes e serve para os vários Ron­nies e vários Élcios que exis­tem por aí, soltos, a seguinte men­sagem:

A Justiça por vezes é lenta, é cega, é bur­ra, é injus­ta, é erra­da, é tor­ta, mas ela chega.

A Justiça chega mes­mo para aque­les que, como os acu­sa­dos, acham que jamais vão ser atingi­dos pela Justiça. Com toda difi­cul­dade de ser inter­pre­ta­da e vivi­da pelas víti­mas, a Justiça chega aos cul­pa­dos e tira deles o bem mais impor­tante depois da vida, que é a liber­dade.

A Justiça chegou para os sen­hores Ron­nie Lessa e Elcio de Queiroz. Os sen­hores foram con­de­na­dos pelos jura­dos do 4º tri­bunal do júri da cap­i­tal:

a 78 anos e 9 meses de reclusão e 30 dias-mul­ta para o acu­sa­do Ron­nie;

a 59 anos de prisão e 8 meses de reclusão e 10 dias-mul­ta para o acu­sa­do Élcio.

Saem os 2 con­de­na­dos a pagar até os 24 anos do fil­ho de Ander­son, Arthur, uma pen­são.

Ficam os 2 con­de­na­dos a pagar, jun­tos, R$ 706 mil de ind­eniza­ção por dano moral para cada uma das víti­mas — Arthur, Ágha­ta, Luyara, Môni­ca e Marinete.

Con­de­no os acu­sa­dos a pagarem as cus­tas do proces­so e man­ten­ho a prisão pre­ven­ti­va deles, negan­do o dire­ito de recor­rer em liber­dade.

Agradeço as partes, a Defen­so­ria Públi­ca, às defe­sas dos 2 acu­sa­dos. Agradeço aos ser­ven­tuários da Justiça, aos poli­ci­ais mil­itares. Ren­o­vo o agradec­i­men­to aos jura­dos.

Encer­ro a sessão de jul­ga­men­to e que­bro a inco­mu­ni­ca­bil­i­dade.

Ten­ham todos uma boa noite”.

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