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Vítima de trabalho análogo à escravidão, mulher é resgatada em Minas

Ela trabalhou quase 30 anos sem salário, férias e quarto próprio

Lety­cia Bond — Repórter da Agên­cia Brasil
Pub­li­ca­do em 21/12/2024 — 18:07
São Paulo
Trabalho escravo
Repro­dução: © MDHC/Divulgação

Mais uma víti­ma de tra­bal­ho anál­o­go à escravidão prat­i­ca­do em uma residên­cia foi res­gata­da, des­ta vez no municí­pio de Além Paraí­ba (MG), a cer­ca de 370 quilômet­ros de Belo Hor­i­zonte. Além de não rece­ber salário nem ter asse­gu­ra­dos dire­itos como o gozo de férias, a mul­her acu­mula­va as funções de domés­ti­ca e cuidado­ra de um de seus patrões, idoso.

Segun­do o Min­istério do Tra­bal­ho e Emprego, o res­gate ocor­reu em 2 de dezem­bro, em oper­ação coman­da­da por uma equipe de fis­cais de Juiz de Fora (MG), com o apoio de dois audi­tores de Con­sel­heiro Lafai­ete (MG). Hou­ve ain­da colab­o­ração do Min­istério Públi­co do Tra­bal­ho e da Polí­cia Fed­er­al.

A víti­ma tra­bal­ha­va para a família des­de 1996, per­manecen­do sem reg­istro em carteira até 2009. Mes­mo com a for­mal­iza­ção naque­le ano, pas­sou todo o perío­do sem dire­ito a férias e salários. Em 2015, de acor­do com o Min­istério do Tra­bal­ho e Emprego, os patrões acharam um modo de burlar a Lei das Domés­ti­cas, que garan­tiria mais dire­itos a ess­es empre­ga­dos que são, em sua maio­r­ia, mul­heres negras. Eles fin­gi­ram que a dis­pen­saram, mas ape­nas deixan­do de faz­er o reg­istro na Carteira de Tra­bal­ho e Pre­v­idên­cia Social, pois ela con­tin­u­ou pre­stando os serviços a eles.

Com isso, acres­cen­ta o min­istério em nota, a tra­bal­hado­ra soma­va ape­nas cer­ca de três anos de recol­hi­men­tos ao Insti­tu­to Nacional do Seguro Social (INSS), ou seja, além de não rece­ber salário, teve um val­or muito baixo de con­tribuição, caso pre­cisas­se de seguro-desem­prego ou out­ro tipo de bene­fí­cio. Ape­sar de ter tra­bal­ha­do cer­ca de três décadas, quase nada desse tem­po foi ofi­cial­mente con­tabi­liza­do para poder se aposen­tar.

A víti­ma tam­bém não tin­ha um quar­to próprio, sendo força­da a dormir no do patrão, nos últi­mos três meses, para man­ter as ativi­dades de cuidado­ra, e pos­suía somente algu­mas peças de roupas, pro­du­tos de higiene, um cober­tor e um espel­ho.

Com o res­gate, os audi­tores fis­cais deter­mi­naram o encer­ra­men­to ime­di­a­to da relação de tra­bal­ho esta­b­ele­ci­da entre a família e a víti­ma. A equipe tam­bém asse­gurou a reg­u­lar­iza­ção do reg­istro da empre­ga­da e o paga­men­to inte­gral dos dire­itos tra­bal­his­tas que lhe foram nega­dos des­de que começou a prestar seu serviço. O MPT fir­mou um acor­do com os empre­gadores para o paga­men­to de ind­eniza­ção à tra­bal­hado­ra.

Na chama­da “lista suja”, ini­ci­a­da em 2005, o primeiro reg­istro de um empre­gador domés­ti­co repor­ta­do como infrator, por explo­rar alguém de modo que se con­fig­urou tra­bal­ho anál­o­go à escravidão, é recente — de 2018.

Uma das prin­ci­pais for­mas de patrões con­vencerem empre­ga­dos domés­ti­cos de que não estão violan­do seus dire­itos é afir­mar que “são parte da família”, o que não é ver­dade, já que a relação é profis­sion­al e não um vín­cu­lo pura­mente afe­ti­vo. Isso impli­ca, por­tan­to, que os patrões devem cumprir com suas obri­gações, em tro­ca do serviço presta­do.

Trabalho escravo contemporâneo

A leg­is­lação brasileira atu­al clas­si­fi­ca como tra­bal­ho anál­o­go à escravidão toda ativi­dade força­da — quan­do a pes­soa é impe­di­da de deixar seu local de tra­bal­ho — desen­volvi­da sob condições degradantes ou em jor­nadas exaus­ti­vas. Tam­bém é passív­el de denún­cia qual­quer caso em que o fun­cionário seja vigia­do con­stan­te­mente, de for­ma osten­si­va, pelo patrão.

De acor­do com a Coor­de­nado­ria Nacional de Errad­i­cação do Tra­bal­ho Escra­vo (Conaete), jor­na­da exaus­ti­va é todo expe­di­ente que, por cir­cun­stân­cias de inten­si­dade, fre­quên­cia ou des­gaste, cause pre­juí­zos à saúde físi­ca ou men­tal do tra­bal­hador, que, vul­neráv­el, tem sua von­tade anu­la­da e sua dig­nidade atingi­da. Já as condições degradantes de tra­bal­ho são aque­las em que o despre­zo à dig­nidade da pes­soa humana se instau­ra pela vio­lação de dire­itos fun­da­men­tais do tra­bal­hador, em espe­cial os ref­er­entes a higiene, saúde, segu­rança, mora­dia, repouso, ali­men­tação ou out­ros rela­ciona­dos a dire­itos da per­son­al­i­dade.

Out­ra for­ma de escravidão con­tem­porânea recon­heci­da no Brasil é a servidão por dívi­da, que ocorre quan­do o fun­cionário tem seu deslo­ca­men­to restri­to pelo empre­gador sob ale­gação de que deve liq­uidar deter­mi­na­da quan­tia de din­heiro.

Como denunciar

O prin­ci­pal canal para se faz­er uma denún­cia é o Sis­tema Ipê. As denún­cias podem ser apre­sen­tadas de modo anôn­i­mo, isto é, sem que o denun­ciante se iden­ti­fique, caso pre­fi­ra.

Out­ra pos­si­bil­i­dade é o aplica­ti­vo Laudeli­na, desen­volvi­do pela Themis — Gênero, Justiça e Dire­itos Humanos e a Fed­er­ação Nacional das Tra­bal­hado­ras Domés­ti­cas (Fena­trad). A fer­ra­men­ta pode ser baix­a­da no celu­lar ou aces­sa­da por um com­puta­dor, sendo que sua tec­nolo­gia per­mite que as usuárias con­sigam uti­lizá-lo no nave­g­ador de inter­net sem que pre­cisem faz­er down­load ou ten­ham uma conexão de alta veloci­dade.

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