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Vítimas receiam impunidade após voto favorável a ex-presidente da Vale

Repro­dução: © Tânia Rêgo/Agência Brasil

Tragédia de Brumadinho completa cinco anos nesta quinta-feira


Pub­li­ca­do em 25/01/2024 — 09:19 Por Léo Rodrigues — Repórter da Agên­cia Brasil — Bru­mad­in­ho /MG

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“De que lado a Justiça quer ser lem­bra­da? De qual lado?”, ques­tiona Andresa Rodrigues, pres­i­dente da Asso­ci­ação dos Famil­iares das Víti­mas e Atingi­dos pelo Rompi­men­to da Bar­ragem em Bru­mad­in­ho (Avabrum). A per­gun­ta ecoa a dor de uma mãe que perdeu o fil­ho e que teme a impunidade.

Assim como par­entes de out­ros mor­tos, ela lamen­ta decisões tomadas recen­te­mente na trami­tação do proces­so crim­i­nal. As prin­ci­pais frus­trações envolvem a fed­er­al­iza­ção do caso e o recente voto favoráv­el ao habeas cor­pus apre­sen­ta­do pelo ex-pres­i­dente da Vale, Fábio Schvarts­man.

A tragé­dia com­ple­ta cin­co anos nes­ta quin­ta-feira (25). Nes­ta mes­ma data, em 2019, o rompi­men­to da bar­ragem da Vale liber­ou uma avalanche de rejeitos que soter­rou 270 vidas e ger­ou ain­da dev­as­tação ambi­en­tal e poluição na bacia do Rio Paraope­ba. As famílias das víti­mas con­tabi­lizam 272 mortes, levan­do em con­ta que duas mul­heres esta­va grávi­das.

No proces­so crim­i­nal, 16 pes­soas respon­dem por homicí­dio doloso qual­i­fi­ca­do e por difer­entes crimes ambi­en­tais. São 11 nomes lig­a­dos à Vale e cin­co vin­cu­la­dos à empre­sa alemã Tüv Süd, que assi­nou o lau­do de esta­bil­i­dade da bar­ragem que se rompeu.

Schvarts­man é um dos réus. Sua defe­sa já apre­sen­tou difer­entes pedi­dos de habeas cor­pus que não tiver­am êxi­to. No entan­to, a fed­er­al­iza­ção do caso deci­di­da em dezem­bro de 2022 abriu a pos­si­bil­i­dade de uma mudança no cenário, ten­do em vista que o novo juí­zo pode apre­sen­tar inter­pre­tações dis­tin­tas daque­las que prevale­ci­am na Justiça mineira.

No ano pas­sa­do, a defe­sa de Schvarts­man lev­ou ao tri­bunal um novo pedi­do de habeas cor­pus pedin­do o tran­ca­men­to da ação penal con­tra ele. Os advo­ga­dos sus­ten­taram que não havia jus­ta causa para o rece­bi­men­to da denún­cia e que não é pos­sív­el imputar nen­hum ato ou omis­são do ex-pres­i­dente da Vale que ten­ha lev­a­do ao rompi­men­to da bar­ragem.

Eles tam­bém obser­varam que um lau­do pro­duzi­do na inves­ti­gação real­iza­da pela Polí­cia Fed­er­al (PF) indi­cou que a per­furação com uma son­da foi o gatil­ho para a tragé­dia. A defe­sa do ex-pres­i­dente da min­er­ado­ra sus­ten­ta que ele não teve con­hec­i­men­to sobre a real­iza­ção desse pro­ced­i­men­to.

Brumadinho (MG), 23/01/2024 -Córrego do Feijão, bairro rural de Brumadinho. Foto: Tânia Rêgo/Agência Brasil
Repro­dução: Bru­mad­in­ho (MG), 23/01/2024 ‑Cór­rego do Fei­jão, bair­ro rur­al de Bru­mad­in­ho. Foto: Tânia Rêgo/Agência Brasil — Tânia Rêgo/Agência Brasil

O lau­do da PF, no entan­to, sinal­iza que a estru­tu­ra já se encon­tra­va em condição precária, do con­trário a per­furação não teria o des­fe­cho trági­co. Não por aca­so, ele foi indi­ci­a­do na inves­ti­gação con­duzi­da pela Polí­cia Fed­er­al e con­cluí­da em novem­bro de 2021.

Antes, ele tam­bém já havia sido indi­ci­a­do pela Polí­cia Civ­il, no inquéri­to que serviu de base para a denún­cia do Min­istério Públi­co de Minas Gerais (MPMG), que deu iní­cio ao proces­so crim­i­nal. O MPMG afir­ma na denún­cia que Schvarts­man tin­ha con­hec­i­men­to das condições precárias da estru­tu­ra.

O jul­ga­men­to do habeas cor­pus teve iní­cio no dia 13 de dezem­bro, com o voto do rela­tor, desem­bar­gador Boson Gam­bo­gi. Ele acol­heu os argu­men­tos da defe­sa. Ain­da restam dois votos. Se mais um deles for favoráv­el a Schvarts­man, o ex-pres­i­dente da Vale deixará a condição de reú. Atual­mente, o jul­ga­men­to está inter­rompi­do dev­i­do ao pedi­do de vis­tas apre­sen­ta­do pelo desem­bar­gador fed­er­al Pedro Felipe San­tos.

Na sem­ana em que o jul­ga­men­to do habeas cor­pus se ini­ciou, a Avabrum con­vo­cou uma agen­da de man­i­fes­tações. Após a divul­gação do voto de Gam­bo­gi, a enti­dade divul­gou uma nota afir­man­do que a posição do desem­bar­gador “enfraque­ce a con­fi­ança dos famil­iares das víti­mas na Justiça”.

A Avabrum tam­bém sus­ten­ta que o tran­ca­men­to de uma ação penal por meio de um habeas cor­pus deve ocor­rer ape­nas em situ­ações excep­cionais, quan­do a acusação é frágil ou quan­do não há descrição da con­du­ta indi­vid­ual do réu. A enti­dade con­sid­era que não é o caso e que, dessa for­ma, caberia a Schvarts­man ten­tar provar sua inocên­cia no cur­so de jul­ga­men­to.

“Ficamos muito revolta­dos. Se ele acha que não par­ticipou de nada, ele tem que provar durante o jul­ga­men­to. Quem deve não teme”, diz a engen­heira civ­il Josiane Melo, que perdeu a irmã e tam­bém inte­gra a dire­to­ria da Avabrum.

Procu­ra­da, a defe­sa de Fábio Schvarts­man infor­mou que pref­ere não se man­i­fes­tar. Josiane tam­bém lamen­ta que, após tan­to tem­po trami­tan­do na esfera estad­ual, o proces­so ten­ha sido fed­er­al­iza­do e volta­do à esta­ca zero, aten­den­do tam­bém um pedi­do da defe­sa de Schvarts­man. “A gente vê isso como resul­ta­do de uma manobra para gan­har tem­po. É uma manobra para o caso pre­scr­ev­er”.

Federalização

O proces­so sobre o rompi­men­to da bar­ragem trami­tou na Justiça estad­ual mineira por três anos. A denún­cia elab­o­ra­da pelo MPMG apon­ta que um con­luio entre a Vale e a Tüv Süd resul­tou na emis­são de declar­ações de condição de esta­bil­i­dade fal­sas que tin­ham como obje­ti­vo escon­der a real situ­ação da bar­ragem e per­mi­tir que as ativi­dades da min­er­ado­ra pudessem ser lev­adas adi­ante.

Com a fed­er­al­iza­ção defini­da em dezem­bro de 2022, o proces­so voltou prati­ca­mente à esta­ca zero. Mes­mo que o MPF ten­ha repeti­do a denún­cia for­mu­la­da pelo MPMG, a mudança de esfera exige uma nova citação os réus e são aber­tos novos pra­zos para a apre­sen­tação das defe­sas.

denún­cia foi acei­ta na Justiça Fed­er­al em janeiro do ano pas­sa­do. Após um ano, os réus ain­da estão sendo cita­dos. Além dis­so, foi dado a cada um deles 100 dias para apre­sen­tar sua defe­sa. A fed­er­al­iza­ção do caso foi ini­cial­mente deter­mi­na­da pelo Supe­ri­or Tri­bunal de Justiça (STJ) aten­den­do um pedi­do da defe­sa de Fábio Schvarts­man.

cen­tro da questão gira­va em torno da sus­pei­ta de ocor­rên­cia de crimes fed­erais como o des­cumpri­men­to da Políti­ca Nacional de Segu­rança de Bar­ra­gens (PNSB) e pos­síveis danos a sítios arque­ológi­cos, que são patrimônios da União. A tese de incom­petên­cia da Justiça estad­ual foi acei­ta mes­mo sob dis­cordân­cia do MPF, que se alin­hou ao entendi­men­to do MPMG.

Na época, o procu­rador-ger­al de Justiça do MPMG, Jar­bas Soares Júnior, disse à Agên­cia Brasil que hou­ve uma inver­são de papéis. Ele con­sider­ou estran­ho que a defe­sa do ex-pres­i­dente da Vale bus­casse incluir mais crimes à denún­cia con­tra o próprio cliente. “Não hou­ve um con­fli­to de com­petên­cia entre os juí­zos e o MPF não reivin­di­cou a sua atribuição. O advo­ga­do do réu é que está dizen­do que teria crimes fed­erais”, disse.

Nes­ta sem­ana, ele voltou a avaliar que a situ­ação é atípi­ca. Como o MPF reap­re­sen­tou a denún­cia do MPMG, os crimes fed­erais cita­dos pela defe­sa de Fábio Schvarts­man não serão jul­ga­dos. “O proces­so está na Justiça Fed­er­al sem uma imputação de crimes fed­erais”, criti­cou Jar­bas.

A fed­er­al­iza­ção tam­bém retirou da Avabrum a condição de assis­tente de acusação. A Justiça estad­ual havia admi­ti­do que a enti­dade aux­il­iasse o MPMG. Quan­do os autos foram remeti­dos à Justiça Fed­er­al, uma nova solic­i­tação foi apre­sen­ta­da. No entan­to, o desem­bar­gador Gam­bo­gi não per­mi­tiu que a Avabrum pudesse atu­ar como assis­tente do MPF.

Edição: Valéria Aguiar

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