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Cem anos do rádio no Brasil: Recife foi “berço”, dizem pesquisadores

Repro­dução: © Mar­cel­lo Casal Jr / Agên­cia Brasil

Pub­li­ca­do em 08/07/2022 — 07:14 Por Luiz Clau­dio Fer­reira — Repórter da Agên­cia Brasil — Brasília

Ouça a matéria:

Em 7 de setem­bro de 1922, cen­tenário da Inde­pendên­cia do Brasil, ocor­reu o que os pesquisadores chamam de primeira grande demon­stração públi­ca radiofôni­ca no Brasil. Hou­ve, na ocasião, a inau­gu­ração da Exposição Inter­na­cional do Rio de Janeiro, que comem­o­ra­va os 100 anos da eman­ci­pação do país. A demon­stração de rádio foi orga­ni­za­da pela empre­sa West­ing­house Inter­na­tion­al Com­pa­ny, usan­do a estação SPC, insta­l­a­da no Cor­co­v­a­do. Naque­le dia, hou­ve o dis­cur­so do pres­i­dente Epitá­cio Pes­soa e as ondas chegaram até a Niterói, a Petrópo­lis e a São Paulo. Mas, a história do rádio pode ter começa­do bem antes deste que é con­sid­er­a­do por muitos o mar­co ini­cial do veícu­lo no Brasil. E em uma cidade que fica a mais de dois mil quilômet­ros da anti­ga cap­i­tal do país.

Recife era uma cidade de 230 mil pes­soas no ano de 1919 e res­pi­ra­va a brisa da mod­ernidade daque­las primeiras décadas do sécu­lo 20. Três anos antes da trans­mis­são car­i­o­ca, apon­ta­da como a primeira trans­mis­são radiofôni­ca do Brasil, a Rádio Clube de Per­nam­bu­co teve papel indis­cutív­el e pio­neiro para o desen­volvi­men­to do rádio como veícu­lo de comu­ni­cação de mas­sa.

Ouça episó­dio da série Cem anos do rádio no Brasil, da Rádio MECsobre a Rádio Clube de Per­nam­bu­co:

Para pesquisadores ouvi­dos pela Agên­cia Brasil, não deve haver uma polêmi­ca sobre onde afi­nal começou o rádio porque os proces­sos eram con­comi­tantes. Pro­fes­sores expli­cam que em 1919, a Rádio Clube de Per­nam­bu­co pas­sou a ter os próprios estatu­tos e gan­hou vis­i­bil­i­dade da mídia. A Rádio Sociedade do Rio de Janeiro seria fun­da­da em 20 de abril do ano seguinte.

Ouça episó­dio da série Cem anos do rádio no Brasil, da Rádio MEC, sobre a Rádio Sociedade do Rio de Janeiro:

A emis­so­ra no Recife, for­ma­da por estu­dantes radioa­madores, foi inau­gu­ra­da em 6 de abril de 1919, e depois rein­au­gu­ra­da em 1923 — o que lhe garan­tiu pio­neiris­mo téc­ni­co. “Foi como um berço para a trans­mis­são radiofôni­ca”, diz o pro­fes­sor Pedro Vaz, pesquisador da história da rádio e pro­fes­sor uni­ver­sitário em São Paulo.

“Con­soante con­vo­cação ante­ri­or, real­i­zou-se hon­tem na Esco­la Supe­ri­or de Elet­ri­ci­dade, a fun­dação do Rádio Club, sob os aus­pí­cios de uma plêi­ade de moços que se dedicam ao estu­do da elet­ri­ci­dade e da telegraphia sem fio (…) a primeira no gênero fun­da­da no país” (tre­cho do doc­u­men­to de fun­dação da Rádio Clube)

A pesquisado­ra Adri­ana San­tana, da Uni­ver­si­dade Fed­er­al de Per­nam­bu­co (UFPE), expli­ca que a rádio no Recife era for­ma­da por pesquisadores muito entu­si­as­ma­dos pelas pos­si­bil­i­dades tec­nológ­i­cas da trans­mis­são sem fio. “Há pesquisas rel­e­vantes sobre o reg­istro históri­co no Recife, mas eu acho que o mais inter­es­sante não é requer­er a pater­nidade ou a mater­nidade da rádio no Brasil, mas a gente con­statar que, no Brasil, havia esse espíri­to da descober­ta que mar­ca esse tem­po”.

A pesquisado­ra con­tex­tu­al­iza que, naque­las primeiras décadas do sécu­lo 20, havia uma efer­vescên­cia cul­tur­al e cien­tí­fi­ca e que gan­hou novo estí­mu­lo com o final da Primeira Guer­ra Mundi­al (1914–1918). “Eram pes­soas com recur­sos e que inves­ti­am em equipa­men­tos e testes. Em ger­al, home­ns de difer­entes profis­sões e lig­a­dos pela paixão por aque­la inven­tivi­dade”, afir­ma.

Mas, con­forme pon­tua o pro­fes­sor Luiz Artur Fer­raret­to, da Uni­ver­si­dade Fed­er­al do Rio Grande do Sul (UFRGS), as primeiras trans­mis­sões de rádio no Brasil devem ser vis­tas como fru­tos de um proces­so e que há um inques­tionáv­el pio­neiris­mo de ações em Per­nam­bu­co, inclu­sive antes de 1919. Na déca­da de 1910, já exis­tem exper­i­men­tos e Recife, por ser uma cidade por­tuária, rece­beu equipa­men­tos. Em 1914, as trans­mis­sões exper­i­men­tais pas­sam a ser proibidas por causa do iní­cio da guer­ra.

O doc­u­men­to Car­ta aber­ta sobre o pio­neiris­mo no rádio brasileiro, pub­li­ca­da por estu­diosos do rádio em setem­bro do ano pas­sa­do, cita amadores operan­do estações ain­da na déca­da de 1910, em uma práti­ca que evoluiu da radiotelegrafia e da radiotele­fo­nia. “Com o surg­i­men­to da KDKA, emis­so­ra pio­neira dos Esta­dos Unidos, inten­si­fi­ca-se o inter­esse deles em relação à trans­mis­são sono­ra. No Brasil, tais irra­di­ações seguiam sendo con­sid­er­adas clan­des­ti­nas. Há reg­istros, inclu­sive, de perseguição das autori­dades em relação aos que oper­avam essas estações”, detal­ha a car­ta.

Não há reg­istros dessas trans­mis­sões em função das proibições no Brasil, “o que se resolve somente após a fun­dação da Rádio Sociedade e por hábil inter­me­di­ação de Edgard Roquette-Pin­to jun­to ao gov­er­no”.

Segun­do esse doc­u­men­to, entende-se que pro­tag­o­nistas foram Oscar Mor­eira Pin­to (radiotelegrafista da Mar­in­ha Mer­cante) e Oscar Dubeux Pin­to (eletricista que trouxe equipa­men­tos para o Brasil). “A primeira trans­mis­são clara de som em ter­ritório brasileiro, no entan­to, é ante­ri­or a tudo isso. Ocor­reu, em 17 de abril de 1911, na cos­ta da Bahia. Tra­ta-se da demon­stração do chama­do sis­tema Tele­funken a bor­do do SMS von der Tann, cruzador-encour­aça­do alemão, de onde se trans­mi­tiu músi­ca cap­ta­da pela Estação de Ama­r­ali­na”, con­tam os pesquisadores no tex­to da car­ta aber­ta.

Na avali­ação do pro­fes­sor Fer­raret­to, rádio como sinôn­i­mo de comu­ni­cação sem fio, sem ser tele­fo­nia, começa no Recife. “No Rio de Janeiro, ele gan­hou força. Ao lon­go dos anos 1920, o veícu­lo vai se trans­for­mar naque­le meio de comu­ni­cação que a gente con­hece hoje como rádio”.

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O jor­nal­ista e pesquisador Luiz Maran­hão Fil­ho tam­bém com­par­til­ha o entendi­men­to que Per­nam­bu­co foi berço do rádio no Brasil, através de um grupo de amadores e estu­dantes de físi­ca, inte­grantes da Esco­la de Elet­ri­ci­dade do Recife. “Foi arte­sanal, com certeza. Os curiosos obtiver­am a fonia, uti­lizan­do um trans­mis­sor de telegrafia sem fio (…) O grupo adap­tou para trans­mi­tir vozes, através de um micro­fone, feito com uma lata de goiaba­da com muitos furos de pre­gos e carvões mag­néti­cos, esten­di­dos em seu inte­ri­or”.

Pedro Vaz expli­ca que tan­to a Rádio Clube de Per­nam­bu­co como a Rádio Sociedade foram pio­neiras. Ele con­tex­tu­al­iza que os orga­ni­zadores e entu­si­as­tas da radiotelegrafia não pen­savam a rádio como con­hece­mos hoje. “Ninguém ali imag­i­nar­ia que iria se tornar o potente veícu­lo da primeira metade do sécu­lo 20”. Ele acres­cen­ta que, a par­tir de fevereiro de 1923, com a insta­lação de um pequeno equipa­men­to de dez watts, foi que a emis­so­ra pas­sou a ser cap­ta­da no cen­tro de Recife.

Experimentação

Aque­les jovens, que tin­ham as refer­ên­cias de Lan­dell de Moura e dos exper­i­men­tos dos anos 1910, enten­der­am a pos­si­bil­i­dade da trans­mis­são de voz à dis­tân­cia. “Eles resolver­am cri­ar uma rádio clube para exper­i­men­tação de trans­mis­são de sons. O que se fez na Rádio Clube de Per­nam­bu­co é embrião para a Sociedade Edu­cado­ra Paulista, do Roquette-Pin­to”, diz Pedro Vaz.

O pro­fes­sor salien­ta que, entre Roquette-Pin­to e Rádio Clube de Per­nam­bu­co, nun­ca hou­ve uma polêmi­ca sobre quem seria pio­neira.  “Ele recon­hecia a Rádio Clube de Per­nam­bu­co e a Rádio Clube tam­bém recon­hecia. Não exis­ti­am brigas pra quem chegou primeiro, pelo con­trário”.

Série de reportagens

Em comem­o­ração aos cem anos do rádio no Brasil, com­ple­ta­dos em 7 de setem­bro de 2022, a Agên­cia Brasil pub­li­ca uma série de dez reporta­gens sobre as prin­ci­pais curiosi­dades históri­c­as do rádio brasileiro.

O cen­tenário do rádio no país tam­bém será cel­e­bra­do com ações mul­ti­platafor­ma em out­ros veícu­los da EBC, como a Radioagên­cia e a Rádio MEC  que trans­mi­tirá, diari­a­mente, inter­pro­gra­mas com entre­vis­tas e pesquisas de acer­vo para abor­dar diver­sos aspec­tos históri­cos rela­ciona­dos ao veícu­lo. A ideia é res­gatar per­son­al­i­dades, pro­gra­mas e emis­so­ras mar­cantes pre­sentes na memória afe­ti­va dos ouvintes.

Edição: Nathália Mendes

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