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Deficiência visual e dança: “Nos palcos, sinto que posso voar”

Gisele Camillo faz parte da Cia de Ballet de Cegos

Paula Labois­sière — Envi­a­da espe­cial*
Pub­li­ca­do em 31/08/2025 — 10:18
Curiti­ba
Brasília (DF) 27/08/2025 - Apresentação da Cia de Ballet de Cegos. Foto: Paula Laboissière/Agência Brasil
Repro­dução: © Paula Laboissière/Agência Brasil

Aos 46 anos, Gise­le Camil­lo real­iza um son­ho de infân­cia: ser baila­r­i­na. O dese­jo de dançar sem­pre esteve pre­sente. Mas a baixa visão, diag­nos­ti­ca­da logo que nasceu, difi­cul­tou um pouco as coisas. “Ten­tei dançar quan­do cri­ança em algu­mas esco­las, quan­do eu ain­da tin­ha baixa visão. Mas eu tin­ha que fin­gir que enx­er­ga­va. Se eu falasse, ninguém me aceita­va. Tin­ha que ficar per­to do pro­fes­sor. E assim eu seguia a vida”. 

Aos 38 anos, por con­ta de um quadro de glau­co­ma, Gise­le perdeu prati­ca­mente toda a visão. Hoje, even­tual­mente, enx­er­ga vul­tos e for­mas. Mas ess­es detal­h­es, segun­do ela, pouco impor­tam quan­do sobe ao pal­co.

“Quan­do estou com as meni­nas no pal­co, nem lem­bro da visão. A gente se aju­da muito, a gente con­ver­sa. A gente apren­deu mes­mo a lidar com a fal­ta da visão no pal­co. Hoje em dia, não faz mais mui­ta difer­ença não.”

Enquan­to Gise­le dança, o cão-guia Faís­ca, labrador carame­lo que acom­pan­ha a baila­r­i­na há cer­ca de dois meses, aguar­da pacien­te­mente. Até então, ela usa­va uma ben­gala para guiar seus movi­men­tos. Recen­te­mente, tomou cor­agem e pas­sou a con­fi­ar boa parte de sua inde­pendên­cia ao com­pan­heiro de qua­tro patas.

Brasília (DF) 27/08/2025 - Faísca, cão-guia de Gisele Camillo, que participa de apresentação da Cia de Ballet de Cegos. Foto: Paula Laboissière/Agência Brasil
Repro­dução: Faís­ca, cão-guia de Gise­le Camil­lo, que par­tic­i­pa de apre­sen­tação da Cia de Bal­let de Cegos. Foto: Paula Laboissière/Agência Brasil

“Na segun­da sem­ana de treina­men­to, con­ver­sei com o instru­tor e con­tei que acha­va que não daria con­ta. Mas ele disse que eu esta­va indo bem, só esta­va fican­do ner­vosa demais. É uma adap­tação com­ple­ta­mente difer­ente, mas estou muito feliz com ele. É um par­ceirão. É liber­dade. Cão-guia é você sair voan­do”, con­ta, enquan­to Faís­ca acom­pan­ha os ensaios.

O projeto

Gise­le faz parte da Cia de Bal­let de Cegos, pro­je­to cri­a­do em 1995 pela baila­r­i­na Fer­nan­da Bian­chi­ni, que desen­volveu o primeiro méto­do de ensi­no de balé clás­si­co para pes­soas com defi­ciên­cia visu­al. Atual­mente, a com­pan­hia de dança con­ta com cer­ca de 200 alunos, sendo 60% deles com algum tipo de defi­ciên­cia visu­al.

“Me sin­to muito feliz e real­iza­da. Sem­pre tive o son­ho de ser dança­ri­na, baila­r­i­na. Quan­do estou no pal­co, me sin­to livre. Sin­to que eu pos­so voar. A gente sem­pre ouviu muitos nãos. Mas, quan­do todo o públi­co aplaude, é aque­le ‘Sim, você é capaz. Sim, você pode’. Toda vez que estou no pal­co, me sin­to muito real­iza­da por estar dançan­do como eu sem­pre quis.”

A ger­ente da Asso­ci­ação Fer­nan­da Bian­chi­ni, Damaris Fer­reira, con­ta que, no começo, a pro­pos­ta de ensi­nar balé para pes­soas com defi­ciên­cia não rece­beu mui­ta cred­i­bil­i­dade da maio­r­ia das pes­soas. “Elas diziam ‘Imag­i­na. Ensi­na qual­quer coisa’. Hoje, a gente vê meni­nas dançan­do com sap­atil­ha de pon­ta e sem visão”.

“Antes, a pes­soa com defi­ciên­cia sem­pre foi uma pes­soa deix­a­da de lado, escon­di­da nas famílias. Hoje, a pes­soa com defi­ciên­cia tem muitos dire­itos, é incen­ti­va­da a muitas coisas”, desta­ca, ao citar que a com­pan­hia de balé já dançou com nomes como o can­tor Ste­vie Won­der e o coreó­grafo Mikhail Barysh­nikov.

Brasília (DF) 27/08/2025 - Apresentação da Cia de Ballet de Cegos. Foto: Paula Laboissière/Agência Brasil
Repro­dução: Apre­sen­tação da Cia de Bal­let de Cegos. Foto: Paula Laboissière/Agência Brasil

Durante o 69º Con­gres­so Brasileiro de Oftal­molo­gia, encer­ra­do no sába­do (30) em Curiti­ba, o grupo de Gise­le apre­sen­tou duas core­ografias. “Como o even­to tem essa car­ac­terís­ti­ca de falar sobre a reabil­i­tação ocu­lar e tem um olhar social para a pes­soa com defi­ciên­cia visu­al, a gente veio para cel­e­brar e diz­er que a pes­soa com defi­ciên­cia pode sim estar e faz­er o que quis­er. Não há lim­ites”, con­cluiu Damaris.

*A repórter via­jou a con­vite do Con­sel­ho Brasileiro de Oftal­molo­gia (CBO)

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